Procede à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo, ordenamento do território e indústria.
Publicação: Diário da República n.º 5/2024, Série I de 2024-01-08, páginas 5 - 52
Emissor: Presidência do Conselho de Ministros
Entidade Proponente: Presidência do Conselho de Ministros
Data de Publicação: 2024-01-08
Decreto-Lei n.º 10/2024
de 8 de janeiro
Sumário: Procede à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo, ordenamento do território e indústria.
No quadro do SIMPLEX, o Programa do XXIII Governo Constitucional elegeu como prioridade a simplificação da atividade administrativa através da contínua eliminação de licenças, autorizações e atos administrativos desnecessários, numa lógica de «licenciamento zero». No mesmo sentido, estipulou-se como objetivo a eliminação de licenças, autorizações e exigências administrativas desproporcionadas que criem custos de contexto sem que tenham uma efetiva mais-valia para o interesse público que se pretende prosseguir.
Apesar de todo o esforço realizado e de avanços alcançados, Portugal ainda enfrenta alguns desafios no seu ambiente de negócios, prejudicando a competitividade do país e dificultando a atratividade do investimento nacional e estrangeiro.
Um dos fatores que contribuem para este diagnóstico são as barreiras excessivas no licenciamento de atividades económicas que foram apontadas em várias análises por instituições internacionais como a Comissão Europeia, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico e o Banco Mundial, como aspetos a endereçar para fomentar a competitividade, a concorrência, o investimento e o crescimento.
Neste contexto, Portugal incluiu no seu Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) uma reforma (TD-r33 - Justiça Económica e Ambiente de Negócios, componente 18) que pretende robustecer e tornar mais eficientes as relações dos cidadãos e das empresas com o Estado e reduzir os encargos e complexidades que inibem a atividade empresarial e assim impactam a produtividade. Num dos eixos desta componente, pretende-se a diminuição da carga administrativa e regulamentar enfrentada pelas empresas, através da redução de obstáculos setoriais ao licenciamento que não tenham justificação.
A concretização deste SIMPLEX dos procedimentos administrativos e dos licenciamentos para as empresas já se iniciou, com a aprovação de um conjunto de medidas de simplificação na área do ambiente e de outras de aplicação transversal, através do Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro.
Serão futuramente adotadas novas iniciativas legislativas com o mesmo propósito de simplificação e redução dos encargos administrativos para as empresas também noutras áreas, incluindo, em especial: i) o comércio, serviços e turismo; e ii) a agricultura.
É agora tempo de continuar a reforma de simplificação dos licenciamentos existentes, através da eliminação de licenças, autorizações, atos e procedimentos dispensáveis ou redundantes em matéria de urbanismo e ordenamento do território, simplificando a atividade das empresas.
O presente decreto-lei pretende ainda continuar a avançar em matéria de habitação, criando condições para que exista mais habitação disponível a custos acessíveis. Assim, este diploma concretiza ainda um dos eixos fundamentais das medidas previstas no âmbito do «Mais Habitação», respondendo à necessidade de disponibilizar mais solos para habitação acessível, mas também simplificar os procedimentos na área do urbanismo e ordenamento do território.
Com efeito, a simplificação destes procedimentos contribui para o aumento dos solos disponíveis, permitindo igualmente que os custos da criação de habitação sejam menores e os tempos de concretização de projetos imobiliários sejam mais reduzidos.
Assim, o presente diploma aprova: i) medidas aplicáveis a toda a Administração Pública e a todos os procedimentos relacionados com o exercício da função administrativa; ii) medidas de simplificação na área do urbanismo; e iii) medidas de simplificação para o ordenamento do território.
São adotadas importantes novidades em matéria de urbanismo, com propósitos de simplificação e de redução de custos de contexto.
Assim, procede-se, em primeiro lugar, à eliminação da necessidade de obter licenças urbanísticas, criando-se, para o efeito, novos casos de comunicação prévia, de isenção e de dispensa de controlo prévio.
Por um lado, são criados novos casos de comunicação prévia, com consequente dispensa de obtenção de uma licença urbanística. Assim, passa a dispensar-se a licença de loteamento e a permitir-se a sua viabilização através de comunicação prévia quando exista plano de pormenor ou unidade de execução que tenham determinados atributos. Em concreto: i) um plano de pormenor ou uma unidade de execução com certas características passam a dispensar a licença de loteamento, aplicando-se a comunicação prévia; ii) um plano de pormenor ou uma unidade de execução que satisfaçam certas condições deixam de exigir a aprovação de obras de urbanização, sendo agora aplicável a comunicação prévia, quando até agora apenas a licença de loteamento permitia esta dispensa; e iii) uma unidade de execução com certas características também passa a dispensar a licença de construção, com aplicação do regime da comunicação prévia, quando até agora apenas o plano de pormenor e a licença de loteamento permitiam essa dispensa.
Note-se que deixa de ser possível escolher seguir o regime da licença quando é legalmente possível seguir o procedimento simplificado da comunicação prévia. Assim, verificou-se que o regime da comunicação prévia era pouco utilizado por receios dos interessados, em resultado de um conjunto de circunstâncias variadas que os incentivavam a utilizar o procedimento mais moroso e consumidor de recursos da licença, em grande medida contrariando o interesse público que se procurava satisfazer. Essas circunstâncias prejudicavam a possibilidade de aproveitar oportunidades de simplificação e redução de custos, pelo que o interesse público impõe a criação de condições para que sejam efetivamente aproveitadas o que, neste caso, envolve a obrigatoriedade de seguir esse procedimento e a impossibilidade de optar por outros mais gravosos, mais demorados e mais consumidores de recursos públicos.
Por outro lado, são acolhidas novas situações de isenção, onde não existe qualquer procedimento administrativo de controlo prévio. É o que passa a suceder, por exemplo: i) quando exista aumento de número de pisos sem aumento da cércea ou fachada (e. g. criação de andar interior em estabelecimento industrial, para melhor aproveitamento do espaço); ii) quando estejam em causa obras interiores que afetem a estrutura de estabilidade, assegurando-se que o técnico habilitado declare, através de termo de responsabilidade que a estrutura de estabilidade é de considerar aceitável face à situação em que o imóvel se encontrava antes da obra realizada, podendo esse documento ter de ser exibido em eventuais ações de fiscalização; iii) quando tenha sido obtida informação prévia suficientemente precisa; e iv) para a substituição de vãos por outros que, conferindo acabamento exterior idêntico ao original, promovam a eficiência energética.
No mesmo sentido, acolhem-se novos casos em que são dispensadas licenças urbanísticas ou outros atos de controlo prévio, apenas havendo lugar à emissão de um parecer não vinculativo pelo município competente. É o que passa a suceder quanto a obras promovidas por empresas do setor empresarial do Estado, empresas municipais e intermunicipais relativas: i) à instalação de equipamentos ou infraestruturas destinadas à instalação de serviços públicos; ii) afetos ao uso direto e imediato do público; iii) nas áreas portuárias ou do domínio público ferroviário ou aeroportuário; iv) quando sejam afetos à habitação ou para pessoas beneficiárias de políticas sociais, incluindo residências para estudantes deslocados; v) a parques industriais, empresariais ou de logística, e similares, nomeadamente zonas empresariais responsáveis (ZER), zonas industriais e de logística; vi) para salvaguarda do património cultural; e, ainda vii) para gestão do parque habitacional do Estado, entre outros.
Naturalmente, são mantidos os poderes de fiscalização para assegurar o cumprimento das normas relevantes e criam-se condições para que os municípios possam contratar serviços de fiscalização sem necessidade de se ter de aguardar pela aprovação de um decreto-lei que regulamente tal possibilidade. Noutro sentido, deixa-se claro que a fiscalização deve orientar-se por critérios de estrita legalidade, estando vedada quanto a aspetos que se relacionem com a conveniência, o mérito ou as opções técnicas das obras realizadas ou em curso.
Em segundo lugar, são simplificados os procedimentos administrativos para obtenção de licenças urbanísticas, para a realização de comunicações prévias e no quadro das informações prévias.
Por um lado, aprova-se um regime de deferimento tácito para as licenças de construção. Ou seja, caso as decisões não tenham sido adotadas nos prazos devidos, o particular poderá realizar o projeto pretendido. Note-se que o potencial desta medida é agora maior, dado que já foi aprovado o mecanismo de certificação do deferimento tácito através da emissão de uma certidão obtida num procedimento eletrónico através do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril, na sua redação atual, o qual permitirá, a partir de 1 de janeiro de 2024, obter um documento que comprove o direito adquirido por deferimento tácito para a realização do projeto.
Por outro lado, elimina-se o alvará de licença de construção, o qual é substituído pelo recibo do pagamento das taxas devidas.
No mesmo sentido, são adotadas várias regras para que a contagem dos prazos seja mais transparente, tal como se fez no âmbito dos procedimentos ambientais, através do Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro. Assim, em resultado do disposto no presente diploma e da aplicação do Código do Procedimento Administrativo com as alterações que o referido Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, introduziu: i) a contagem dos prazos passa a iniciar-se com a entrega do pedido pelo particular e não num momento intermédio no procedimento, sendo de difícil apreensão para o interessado; ii) os prazos só se suspendem se o particular demorar mais de 10 dias a responder a pedidos de informação, documentos adicionais ou a outras solicitações da Administração Pública; e iii) apenas é possível pedir por uma única vez informações, documentos adicionais ou formular outras solicitações durante o procedimento.
Também como se fez quanto à simplificação de procedimentos na área do ambiente, os prazos legalmente previstos são alargados, pois a sua contagem inicia-se agora com a submissão do pedido e não num momento posterior. Preferiu-se adotar regras que tornem a contagem e o controlo dos prazos mais transparentes e prever prazos realistas do que legislar adotando exigências que se sabe serem de cumprimento extremamente difícil.
Adicionalmente, determina-se que, caso não exista rejeição liminar ou convite para corrigir ou completar o pedido ou a comunicação, considera-se que o requerimento ou a comunicação se encontram corretamente instruídos, não podendo ser indeferido o pedido com fundamento na sua incompleta instrução.
Ainda quanto à simplificação dos procedimentos urbanísticos, elimina-se a necessidade de parecer da entidade competente em matéria de património cultural em várias situações. Assim, quanto a imóveis localizados em zonas de proteção de bens imóveis em vias de classificação ou de bens imóveis classificados de interesse nacional ou de interesse público, não há lugar a parecer da entidade competente em matéria de património cultural quando: i) se trate de obras no interior de bens imóveis, desde que não se verifique impacte no subsolo, ou alterações relativas a azulejos, estuques, cantarias, marcenaria, talhas ou serralharia; ii) se trate de obras de conservação no exterior; e iii) relativamente à instalação de reclamos publicitários, sinalética, toldos, esplanadas e mobiliário urbano.
Com o mesmo propósito de criar condições para que os procedimentos de licença urbanística sejam mais ágeis, permite-se a delegação de competências nestas matérias nos dirigentes dos serviços, assim evitando a concentração de competências no vereador com pelouro.
Além disto, por um lado, alarga-se o prazo de validade da informação prévia favorável de um para dois anos, sem necessidade de solicitar prorrogações. E, por outro, permite-se que o prazo de execução das obras possa ser prorrogado sem os limites atuais, de apenas poder ocorrer uma única vez e por período não superior a metade do prazo inicial.
Em terceiro lugar, com o objetivo de uniformizar procedimentos urbanísticos e de evitar que existam práticas e procedimentos diferentes em vários municípios, são adotadas medidas para impedir tratamentos injustificados e assimétricos, quando essa assimetria não se justifica. Note-se que as presentes medidas não prejudicam a possibilidade de cada município ter as suas próprias normas acerca da ocupação dos solos e condições de edificação. Estas apenas visam impedir que, em matérias de natureza procedimental e formal, não existam regras diferentes em cada município, as quais significam custos excessivos e desproporcionados para os particulares pela diversidade e dispersão das soluções adotadas.
Neste sentido, explicita-se que os regulamentos municipais só podem abranger certo tipo de matérias, não podendo, por exemplo, abordar matérias relativas aos procedimentos administrativos ou a documentos instrutórios, assim procurando tornar os procedimentos mais semelhantes nos vários municípios do País.
Adicionalmente, impede-se que os municípios possam exigir documentos instrutórios adicionais face aos previstos na lei e em portaria especificamente destinada à identificação desses documentos. Assim, para efeitos de clarificação, é adotada uma lista não exaustiva de documentos que não podem ser exigidos, nem pela referida portaria nem pelos regulamentos ou pela prática dos municípios. Tal lista inclui a proibição de solicitar, por exemplo, os seguintes documentos instrutórios: cópias de documentos na posse da câmara, a caderneta predial, o reenvio de certidão permanente ou do seu código por o seu prazo de validade ter expirado quando era válido no momento da apresentação do pedido, o livro de obras digitalizado, declarações de capacidade profissional dos técnicos responsáveis pelos projetos, emitida por qualquer entidade, incluindo ordens profissionais, entre outros.
Além disso, prevê-se a existência de uma Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos, que permita: i) apresentar pedidos online; ii) consultar o estado dos processos e prazos; iii) receber notificações eletrónicas; iv) obter certidões de isenção de procedimentos urbanísticos; v) uniformizar procedimentos e documentos exigidos pelos municípios, evitando a multiplicação de práticas e procedimentos diferentes; e, entre outras funcionalidades; a vi) futura submissão de pedidos em formato Building Information Modelling (BIM), com automatização da verificação do cumprimento dos planos aplicáveis.
Esta Plataforma será de utilização obrigatória para os municípios a partir de 5 de janeiro de 2026 e não será possível adotar passos procedimentais ou documentos que nela não se encontrem previstos. No entanto, os municípios poderão utilizar os seus sistemas informáticos, em interoperabilidade com a Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos e o sítio na Internet do município continuará a ser um canal de acesso específico à mesma Plataforma, sem prejuízo de existir um sítio específico na Internet para apresentação e gestão de pedidos urbanísticos em todo o País.
Em quarto lugar, são clarificados os poderes de cognição dos municípios no exercício do controlo prévio urbanístico, em especial relativamente à emissão de licenças.
Assim, em geral, cabe ao município verificar: i) a inserção do edifício no território (controlo do cumprimento dos planos, medidas preventivas, área de desenvolvimento urbano prioritário e de construção prioritária, servidões administrativas, restrições de utilidade pública e o uso proposto; ii) a estética exterior e a inserção do projeto na paisagem; e iii) a suficiência das infraestruturas. Não compete ao município apreciar questões relativas ao interior dos edifícios ou matéria relativa às especialidades (águas, eletricidade, gás, etc.). Para clarificação, é elaborada uma lista não exaustiva de aspetos que não cabe ao município analisar, uma vez que os mesmos são elaborados com base em declarações de cumprimento das normas legais aplicáveis por técnicos competentes.
A limitação dos poderes dos municípios no momento do controlo prévio ou emissão de licença não prejudica os seus poderes de fiscalização, ao abrigo das competências que lhes cabem em matéria de tutela da legalidade urbanística. É clarificado que tais poderes se devem exercer no quadro da legalidade e que se destinam a verificar o cumprimento da lei e não a adotar medidas de tutela urbanística com base em juízos de oportunidade, conveniência ou opiniões de natureza técnica.
Em quinto lugar, são eliminadas certas exigências excessivas em matéria de controlo prévio urbanístico.
Assim, por um lado, são revogadas ou substituídas certas exigências do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) que se consideram limitativas sem corresponder à proteção de um interesse público atual. A título de exemplo: i) elimina-se a obrigatoriedade da existência de bidés em casas de banho; ii) permite-se que possa existir um duche em casas de banho, em vez de banheiras; e iii) viabiliza-se a utilização de soluções para cozinhas como kitchenettes ou cozinhas walk through. Ao mesmo tempo, revogam-se várias normas do RGEU que já se encontram reguladas de forma mais completa noutros diplomas ou que não se conformam com as medidas de simplificação que agora são adotadas.
Num outro plano, aprova-se a revogação do RGEU com efeitos a 1 de junho de 2026.
Também se elimina a necessidade de obtenção de uma licença específica para ocupação do espaço público e que se revela frequentemente necessária para as obras quando é fundamental, por exemplo, utilizar caixas de entulho ou andaimes. O pedido de licença de construção passa, assim, a poder englobar a ocupação do espaço público e a licença de construção abrangerá, nesses casos, a possibilidade de ocupação desse espaço na medida do que seja necessário para realizar a obra, dispensando-se procedimentos e atos adicionais.
Igualmente, são eliminadas as exigências desproporcionadas e excessivas relativas às caixas de correio, bem como a obrigação de os municípios verificarem o cumprimento das mesmas.
Por último, e ainda em matéria de urbanismo, relativamente à eliminação de exigências excessivas, esclarece-se que a requisição da presença de forças e serviços de segurança nas obras é facultativa, não podendo ser exigida ao promotor por entidades públicas.
Em sexto lugar, são adotadas medidas destinadas a simplificar o processo de obtenção da autorização para utilização.
Deste modo, é eliminada a autorização de utilização quando tenha existido obra sujeita a um controlo prévio, substituindo-se essa autorização pela mera entrega de documentos, sem possibilidade de indeferimento, mas, naturalmente, mantendo-se todos os poderes de fiscalização durante e após a obra.
Por seu turno, quando exista alteração de uso sem obra sujeita a controlo prévio, deve ser apresentada uma comunicação prévia com um prazo de 20 dias para o município responder, considerando-se aceite o pedido de autorização de utilização, caso o município não responda.
Em sétimo lugar, simplificam-se os processos em matéria de especialidades, o que se faz em várias dimensões.
Nestes termos, clarifica-se que os municípios não apreciam nem aprovam projetos de especialidades, os quais são remetidos para mera tomada de conhecimento e arquivo, acompanhadas de termos de responsabilidade emitidos pelos técnicos competentes em como os projetos foram realizados em conformidade com a lei.
Em oitavo lugar, simplificam-se os processos de receção das obras de urbanização.
Assim, por exemplo, determina-se a obrigação de os municípios aceitarem a cessão para a sua posição contratual da garantia dada pelo empreiteiro ao promotor para a realização das obras de urbanização, eliminando o custo com a emissão de novas garantias.
Por último, simplificam-se as formalidades relacionadas com a compra e venda do imóvel, eliminando formalidades que não representam valor acrescentado. Com esse propósito, sendo eliminadas, no momento da celebração do contrato de compra e venda do imóvel, a exibição ou prova de existência da ficha técnica de habitação e da autorização de utilização ou de demonstração da sua inexigibilidade.
Num terceiro conjunto de intervenções, são aprovadas algumas alterações destinadas a simplificar processos em matéria de ordenamento do território.
Assim, em primeiro lugar, é simplificado o processo de reclassificação de solo rústico em solo urbano, com finalidade industrial, de armazenagem ou logística. Trata-se de uma iniciativa fundamental para viabilizar projetos de natureza industrial de envergadura significativa, existindo hoje uma carência de espaços que possam ser afetos a esta finalidade. Igualmente, é um procedimento que se revela indispensável para aumentar a disponibilidade de habitação a custos controlados.
Nos termos deste processo simplificado: i) realiza-se apenas uma consulta pública, evitando-se diversas consultas públicas com objeto semelhante ou sobreposto; ii) prevê-se uma conferência procedimental, para todas as entidades se pronunciarem simultaneamente; iii) determina-se que o procedimento não para durante o período de consulta pública, antes continuando a ser desenvolvido; e iv) atribui-se competência à assembleia municipal para a respetiva aprovação. Este procedimento não se aplica em áreas sensíveis ou em áreas da reserva ecológica nacional ou da reserva agrícola nacional.
Em segundo lugar, criam-se condições para acelerar os procedimentos de aprovação de planos de urbanização e planos de pormenor, através: i) da eliminação do acompanhamento da elaboração dos mesmos pelas comissões de coordenação e desenvolvimento regional; e ii) da eliminação da fase de concertação.
Em terceiro lugar, cria-se condições para a simplificação do controlo urbanístico através da criação de novos casos de comunicação prévia que substituam licenças urbanísticas, através de uma densificação do conteúdo das unidades de execução sem, contudo, prejudicar a flexibilidade que este instrumento atualmente oferece.
Deste modo, clarifica-se que as unidades de execução podem: i) conter desenho urbano; ii) incluir a programação das obras de urbanização; e iii) envolver contrato de urbanização para o seu desenvolvimento. Caso a unidade de execução inclua o desenho urbano e a programação de obras de urbanização, deixa de ser necessária a licença de construção ou de loteamento, podendo as operações urbanísticas fazer-se na base de comunicações prévias, tal como acima se referiu.
A aprovação de atos legislativos é apenas um dos momentos do processo de adoção de políticas públicas, sendo necessário assegurar a sua implementação, para alcançar efetivamente os objetivos estabelecidos. No presente caso, a efetiva implementação da presente política pública exige um significativo empenho por parte da Administração Pública, uma vez que algumas das medidas previstas no presente decreto-lei implicam a alteração de procedimentos e práticas administrativas, a criação e adaptação de sistemas informáticos, a formação de trabalhadores da Administração Pública e a realização de ações e tarefas inovadoras. Assim, determina-se que cabe à Agência para a Modernização Administrativa, I. P., coordenar a execução das presentes medidas, garantindo que a mesma ocorre atempadamente.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 50/2023, de 28 de agosto, no desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, e nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
1 - O presente decreto-lei aprova medidas para promover a habitação e reduzir os encargos e simplificar os procedimentos administrativos em matéria de urbanismo e ordenamento do território, sobre as empresas, designadamente através da:
a) Eliminação da necessidade de obter licenças urbanísticas ou de realizar comunicações prévias, identificando-se novos casos de isenção ou dispensa de controlo prévio pelos municípios;
b) Eliminação da necessidade de obter algumas licenças, criando novos casos em que apenas é exigível uma comunicação prévia;
c) Adoção de um regime de deferimento tácito para as licenças de construção, ao qual é aplicável o regime da certificação do deferimento tácito através da emissão de uma certidão obtida num procedimento eletrónico prevista no Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril, na sua redação atual;
d) Eliminação do alvará de licença de construção, o qual é substituído pelo recibo do pagamento das taxas devidas;
e) Eliminação da autorização de utilização quando tenha existido obra sujeita a um controlo prévio, substituindo-se essa autorização por uma mera entrega de documentos relativos ao projeto, os quais não podem ser aprovados ou apreciados;
f) Adoção de uma comunicação prévia com prazo de 20 dias, quando exista alteração de uso sem obra sujeita a controlo prévio, considerando-se aceite o pedido de autorização de utilização, caso o município não responda naquele prazo;
g) Determinação de que a informação prévia favorável, emitida na sequência de pedido de informação prévia, tem um prazo de dois anos, com a possibilidade de prorrogação por um ano;
h) Flexibilização dos termos em que pode ser aceite o pedido do prazo de execução das obras, através da eliminação de que este apenas possa correr por uma única vez e do limite de a prorrogação não poder ser superior a metade do prazo inicial;
i) Permissão para que exista delegação de competência aos dirigentes dos serviços do município em novas situações, seja para conceder licenças de construção, evitando, assim, a concentração de competências na câmara municipal, no presidente da câmara municipal ou no vereador com o pelouro respetivo;
j) Adoção de regras para que a contagem dos prazos de decisão seja mais transparente, através das seguintes medidas:
i) Contagem dos prazos de decisão a partir da data da entrega do pedido pelo interessado e não de um momento intermédio no procedimento;
ii) Os prazos só se suspendem se o particular demorar mais de 10 dias a responder a pedidos de informação, documentos adicionais ou a outras solicitações da Administração Pública, pelo que, se a Administração Pública formular esses pedidos, os prazos de decisão não ficam automaticamente suspensos; e
iii) A Administração Pública só pode pedir por uma única vez informações, documentos adicionais ou formular outras solicitações durante o procedimento;
k) Determinação de que, caso não exista rejeição liminar ou convite para corrigir ou completar o pedido ou a comunicação, se considera que o requerimento ou a comunicação se encontram corretamente instruídos, não podendo ser indeferido o pedido com fundamento na sua incompleta instrução;
l) Determinação de que, em caso de pedidos de pareceres, o procedimento deve continuar durante o lapso temporal entre o pedido de parecer, autorização ou consulta e a sua emissão e o decurso do respetivo prazo;
m) Determinação de que não há lugar a parecer da entidade competente em matéria de património cultural relativamente aos imóveis localizados em zonas de proteção de bens imóveis em vias de classificação ou de bens imóveis classificados de interesse nacional ou de interesse público, quando:
i) Se trate de obras no interior de bens imóveis, desde que não se verifique impacte no subsolo, ou alterações relativas a azulejos, estuques, cantarias, marcenaria, talhas ou serralharia;
ii) Se trate de obras de conservação no exterior; e
iii) Relativamente à instalação de reclamos publicitários, sinalética, toldos, esplanadas e mobiliário urbano;
n) Previsão de uma Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos, obrigatória a partir de 5 de janeiro de 2026, que permita a apresentação de pedidos online, consultar o estado dos processos e prazos, receber notificações eletrónicas, obter certidões de isenção de procedimentos urbanísticos, uniformizar procedimentos e documentos exigidos pelos municípios, evitando a multiplicação de práticas e procedimentos diferentes e, entre outras funcionalidades, a futura submissão de pedidos em formato Building Information Modelling (BIM);
o) Clarificação de que apenas compete ao município verificar o cumprimento de normas de planos municipais ou intermunicipais de ordenamento no território, medidas preventivas, áreas de desenvolvimento urbano prioritário, áreas de construção prioritária, servidões administrativas, restrições de utilidade pública, o uso proposto, as normas legais e regulamentares relativas ao aspeto exterior e à inserção urbana e paisagística das edificações e a suficiência das infraestruturas, não lhe competindo, designadamente, apreciar questões relativas ao interior dos edifícios ou matéria relativa às especialidades (águas, eletricidade, gás, etc.);
p) Clarificação de que os municípios não apreciam nem aprovam projetos de especialidades, os quais são remetidos para mera tomada de conhecimento e arquivo, acompanhados de termos de responsabilidade emitidos pelos técnicos competentes em como os projetos foram realizados em conformidade com a lei;
q) Revogação ou substituição de certas exigências do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU) que se consideram limitativas e que não correspondem à proteção de um interesse público atual como, por exemplo, a obrigatoriedade da existência de bidés em casas de banho, a possibilidade de que na casa de banho possa existir um duche, em vez de uma banheira, e a utilização de soluções para cozinhas como kitchenettes ou cozinhas walk through;
r) Revogação do RGEU com efeitos a 1 de junho de 2026;
s) Indicação de que os regulamentos municipais só podem abranger certo tipo de matérias, não podendo, por exemplo, abordar matérias relativas aos procedimentos administrativos ou a documentos instrutórios, assim procurando tornar os procedimentos mais semelhantes nos vários municípios do país;
t) Eliminação de exigências excessivas de documentos instrutórios a remeter pelos interessados quando apresentam pedidos relativos a operações urbanísticas como, por exemplo, livros de obras digitalizados ou procurações autenticadas, reconhecidas ou certificadas;
u) Eliminação da necessidade de obtenção de uma licença específica para ocupação do espaço público, passando a licença ou a comunicação prévia urbanística a integrar essa licença, que por vezes é necessária para a realização da obra, pois refere-se, por exemplo, à colocação de caixas de entulho ou à colocação de andaimes na via pública;
v) Eliminação das exigências desproporcionadas e excessivas relativas às caixas de correio, bem como a obrigação de os municípios verificarem o cumprimento das mesmas;
w) Proibição da exigência de forças policiais para a realização da obra;
x) Obrigação de os municípios aceitarem a cessão para a sua posição contratual da garantia dada pelo empreiteiro ao promotor para a realização das obras de urbanização, assim eliminando o custo com a emissão de novas garantias;
y) Simplificação das formalidades relacionadas com a compra e venda do imóvel, através da eliminação de exibição ou prova de existência da ficha técnica de habitação e da autorização de utilização;
z) Simplificação do processo de reclassificação de solo rústico em solo urbano, com finalidade industrial, de armazenagem ou logística ou de habitação a custos controlados;
aa) Agilização dos procedimentos de aprovação de planos de urbanização e planos de pormenor, através da eliminação do acompanhamento da elaboração dos mesmos pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional e da eliminação da fase de concertação;
bb) Criação de condições para a existência de um maior número de casos de isenção de controlo urbanístico, ou seja, para a eliminação da necessidade de obter licenças ou realizar comunicações prévias, através da densificação do conteúdo das unidades de execução que, quando possuam certas características, passam a dispensar a licença ou a comunicação prévia.
2 - Para efeitos do disposto número anterior, o presente decreto-lei procede:
a) À alteração ao Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, na sua redação atual, que estabelece o regime jurídico da urbanização e da edificação (RJUE);
b) À alteração ao Regulamento Geral das Edificações Urbanas (RGEU), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38382/51, de 7 de agosto, na sua redação atual;
c) À quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto, alterado pelos Decretos-Leis n.os 136/2014, de 9 de setembro, 125/2017, de 4 de outubro, e 95/2019, de 18 de julho, que estabelece o regime da acessibilidade aos edifícios e estabelecimentos que recebem público, via público e edifícios habitacionais;
d) À sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 307/2009, de 23 de outubro, na sua redação atual, que estabelece o regime jurídico da reabilitação urbana;
e) À terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 115/2011, de 5 de dezembro, e 265/2012, de 28 de dezembro, que estabelece o procedimento de classificação dos bens imóveis de interesse cultural, bem como o regime das zonas de proteção e do plano de pormenor de salvaguarda;
f) À primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 95/2019, de 18 de julho, que estabelece o regime aplicável à reabilitação de edifícios ou frações autónomas;
g) À oitava alteração ao regime jurídico das autarquias locais, aprovado em anexo à Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, na sua redação atual;
h) À alteração ao Código Civil, aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 47344/66, de 25 de novembro, na sua redação atual;
i) À quarta alteração à Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, alterada pela Lei n.º 74/2017, de 16 de agosto, e pelos Decretos-Leis n.os 3/2021, de 7 de janeiro, e 52/2021, de 15 de junho, que aprova a lei de bases gerais da política pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo;
j) À quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, alterado pelos Decretos-Leis n.os 81/2020, de 2 de outubro, 25/2021, de 29 de março, e 45/2022, de 8 de julho, que aprova a revisão do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial.
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