I - Na ordem jurídica portuguesa, vigoram em simultâneo dois regimes de competência internacional, o regime comunitário e o regime interno, sendo que, quando a acção estiver compreendida no âmbito de aplicação do regime comunitário, este prevalece sobre o regime interno, por ser de fonte hierarquicamente superior, face ao princípio do primado do direito europeu.
II - O regime comunitário consta do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, que substituiu o Regulamento (CE) n.º 44/2001, de 22 de Dezembro de 2000, aplicável às acções judiciais intentadas até 10 de Janeiro de 2015.
III - Em matéria civil e comercial, o regime regra para fixação da competência internacional e critério fundamental de conexão é o do domicílio do requerido (localizado num Estado-Membro), independentemente da nacionalidade deste.
IV - No entanto, são enumerados nas secções 2 a 7 (artigos 7º a 26º) desse regulamento um conjunto de critérios especiais, nomeadamente o relativo à fixação convencional da jurisdição, prevista no artigo 25º, nº 1.
V - Dispôs ex novo este preceito, já que tal não constava do correspondente artigo 23º, nº 1, do Regulamento 44/2001, que a validade substancial do pacto de jurisdição será conhecida nos termos da lei do Estado-Membro do tribunal nele designado como competente para a resolução do litígio.
VI - No caso em apreço, sendo francês o tribunal cuja competência foi convencionalmente designada, não colhe a invocação da nulidade da cláusula pactuada, por violação do disposto no artigo 94º, nº 3, alínea c), do Código de Processo Civil, ou dos artigos 5º, 6º e 8º do DL 446/85, de 25 de Outubro, posto que não existe na lei processual civil francesa preceito idêntico àquele, nem as normas do Code de la Consommation correspondentes a estes últimos são in casu aplicáveis, dado que os autores não intervieram no contrato na qualidade de consumidores.
VII - Não constando do contrato celebrado pelos autores com uma das rés, também com domicílio em Portugal, nenhum pacto de jurisdição, nada impede que essa ré seja demandada perante tribunal português, excepto no que concerne ao pedido absolutamente dependente de pedido formulado contra outra ré, com a qual os autores convencionaram a competência exclusiva de tribunal francês.
VIII - Não havendo litisconsórcio necessário passivo, nada obsta ao conhecimento de um pedido subsidiário para o qual os tribunais portugueses sejam internacionalmente competentes, mesmo que subsequente ao afastamento da competência destes quanto ao pedido principal, do qual aquele não seja dependente, não cabendo em tal caso recurso à regra do nº 3 do artigo 82º do Código de Processo Civil, apenas válida no âmbito da competência em razão do território.
IX - A possibilidade conferida pelo artigo 8º, nº 1, do Regulamento n.º 1215/2012, de que «uma pessoa com domicílio no território de um Estado-Membro pode também ser demandada, se houver vários requeridos, perante o tribunal do domicílio de qualquer um deles, desde que os pedidos estejam ligados entre si por um nexo tão estreito que haja interesse em que sejam instruídos e julgados simultaneamente para evitar decisões que poderiam ser inconciliáveis se as causas fossem julgadas separadamente», não será de admitir se contender com regras que envolvam atribuição de competência exclusiva, como a que pode resultar de pacto atributivo de jurisdição, nos termos previstos no artigo 25º, nº 1, daquele regulamento.
PUB