I - A figura do “caminho público” foi sendo objecto de longo debate, sobretudo a nível jurisprudencial, com o marcante confronto entre duas opostas posições: uma defendendo que deveriam ser tidos como caminhos públicos aqueles que estivessem, desde tempos imemoriais, no uso directo e imediato do público; outra, mais exigente, sustentando que só deveriam considerar-se caminhos públicos aqueles que, além de se acharem no uso directo e imediato do público, fossem produzidos e/ou administrados pelo Estado ou outra pessoa de direito público, e se encontrassem sob a respectiva jurisdição.
II - Por Assento de 19-04-1989 (publicado no DR, Série I, de 02-06-1989), hoje com valor de AUJ, o STJ, no sentido de pôr termo a tal diferendo, decidiu que “[s]ão públicos os caminhos que, desde tempos imemoriais, estão no uso directo e imediato do público”.
III - No entanto, não tendo tal resolvido a questão, veio posteriormente este Alto Tribunal a concluir pela necessidade de se levar a efeito uma interpretação restritiva do Assento referido em II no sentido de que “a publicidade dos caminhos exige ainda a sua afectação a utilidade pública, ou seja, que a sua utilização tenha por objectivo a satisfação dos interesses colectivos de certo grau ou relevância”, sob pena de, seguindo à letra o seu dispositivo, também os atravessadouros com posse imemorial haverem de ser considerados como caminhos públicos, ao arrepio do disposto no art. 1383.º do CC.
IV - Mais recentemente, o STJ, por acórdão de 28-05-2013, veio, em nova inflexão, ressalvar que que essa interpretação restritiva do Assento referido em II pressupõe que “[n]o caso de passagem ou caminho, que não se integra em nenhuma propriedade privada, existente num lugar e que desde tempos imemoriais liga duas ruas desse lugar, a prova do seu uso imemorial pela população basta para se considerar tal caminho como caminho público, não se impondo qualquer interpretação restritiva do assento”.
V - Provando-se que o caminho em causa nos autos era apenas utilizado pelos proprietários dos prédios a que dava acesso – uns não identificados e outros os antecessores das partes – e uma vez que a existência de um acesso aberto a pessoas determinadas ou a um círculo determinado de pessoas é insuficiente para se falar de “utilização pública”, sendo mister a sua utilização por uma generalidade de pessoas, não pode senão concluir-se pela impossibilidade considerar o ajuizado caminho como sendo um “caminho público”.
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